domingo, 28 de setembro de 2025

Hollow

 


Série “O Arquitecto”. A cada episódio, reconheço-te no reflexo distorcido dos gestos, na música subterrânea das frases. O tempo passa, as máscaras mudam, mas o traço persiste: és sempre tu, o eixo da tua própria órbita. Há um altar secreto onde o único deus és tu, e a única devoção é a que te ofereces.

O teu discurso de “amor louco” era uma peça de teatro que encenavas para mim e para ti próprio. Eu, ingénua e faminta de ternura, quase acreditava no mito. Tu também. Mas era apenas mais um acto do teu labirinto narcísico, onde seduzir é um mecanismo de sobrevivência e manipular é o único verbo que conjugas sem esforço.

Hoje, depois de uma década a aprender as cicatrizes das tuas mãos, leio-me de outra forma. Como amei. Como me fui diluindo na ilusão de ser escolhida, mesmo sendo “a outra”. Como me anulei, mulher de sombra, arrumada às sobras da tua vida oficial. A minha auto-estima rastejava pelo subsolo, o meu amor-próprio não tinha nome.

Agora sei o meu valor. Carrego o meu próprio respeito como quem carrega uma luz nova. Olho para a jovem que fui: frágil, órfã de validações, viciada em migalhas. Olho para ti: não um homem maior do que a vida, mas um eco, um espelho rachado, uma caixa vazia. Narcisismo, manipulação, egoísmo; não troféus, mas sintomas de ausência: de empatia, de valores, de substância.


Amei-te até à exaustão. Submeti-me até à mudez. E agora, olhando para trás, percebo: não eras um enigma. Eras apenas o meu próprio deserto, espelhado.


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